segunda-feira, 3 de março de 2008

Zico nunca existiu


Artur era o goleiro de um time pequeno. Desses esquecidos, que na década de oitenta, por culpa do inchaço no campeonato brasileiro se aventurou na elite do futebol do país. Mais do que isso, teve a honra de enfrentar, no maracanã, o Flamengo de Zico, Adílio e Júnior. Honra como a de um burguês, que é convidado para a festa da nobreza; em que é preciso ter mais cautela do que gratidão, para que o convite não vire ultraje.

Artur não ligou para o placar, sabia que seria derrotado. Queria apenas defender um penalti, do seu xará. Um daqueles penaltis que Arthur jamais errou, que de lambuja batia de fora da área, com barreira na frente, sem esconder, do goleiro, o canto que ia fuzilar..

O Goleiro treinou duro, sempre no pôr do sol, após todos seus companheiros abandonarem o campo, ele ficava horas pulando em direção ao ângulo esquerdo.

No dia do jogo, surpreendentemente, o Flamengo jogou mal. O Time era reserva, mas ótimo, incomparável com esse de hoje em dia. O jogo estava 0x0, Artur era pouco exigido, e Zico só entrara aos 35 do segundo tempo.

Artur parecia decepcionado com o fato de que Zico não bateria uma falta naquele jogo. Seu time batia muito, mas sempre longe da aérea. Foi o que seu treinador – precursor do Muricy – pedira.

Zico, aos 42, foi buscar a bola na altura do meio de campo. De costas colocou no vazio do lado esquerdo, Júnior correu e chegou milímetros antes do zagueiro. Adiantou muito a bola, para passar por ele, parecia que a bola ficaria com zagueiro que estava na sobra. Mas, Júnior esticou a perna e levou a melhor. Os segundos que deixaram o zagueiro sem a bola, quase deixaram Júnior sem as pernas. Falta, Zico vai cobrar.

Artur tinha total confiança, treinará muito, sabia que defendendo poderia dizer a todo mundo que pegou uma falta de Zico, aos 42, com o maracanã cheio e garantindo o empate.

Zico foi para bola, Artur deu um, dois passos e pulou. Ela vinha devagar, parecia mais fácil do que era. Já sorrindo viu a bola passa entre sua mão e a trave, naquele espaço, que só os deuses do maraca conhecem. E que nenhum estudioso do universo imagina que exista.

Artur chorou, ninguém viu. Um choro de criança, livre, sem injúria, só constatando a dor da derrota. Não havia como culpar o juiz, nem a torcida. O culpado era Zico. A vitória inquestionável.

Tão certo como dois e dois são quatro. Tão certo, quanto os chutes de Zico. Tão certo quanto o flamengo sempre jogou com doze. Mas houve tempos, em que ele era apenas um espírito que rondava a área adversária e botava a bola no ângulo.

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